o convento (ainda) possível


O livro Velhos e Novos Mundos - Estudos de Arqueologia Moderna conta com um capítulo dedicado à escavação no Convento do Bom Jesus da autoria da Dr. Cláudia Cunha, arqueóloga responsável pela intervenção. Este artigo está disponível aqui na íntegra, e parece-me merecedor do vosso interesse. Eu já dei uns lamirés neste post.
Esta escavação foi realizada devido a uma denúncia ao IGESPAR depois de o Continente já estar construído, tendo portanto grande parte do local já sido destruída antes de começar a investigação.
No entanto, em boa hora chegou a equipa da Dr. Cláudia Cunha, que ainda conseguiu dar a volta ao projeto de saneamento do hipermercado e assim preservar o que ainda não tinha sido destruído até à data.
Mas mais do que lamentar as estruturas demolidas ou regozijar-nos pelas que foram salvas, é preciso tomarmos em conta que este espaço se encontra  numa zona da cidade em frente ao mar, com ótimos acessos. É uma zona pela qual a expansão da cidade vai ter de passar a médio prazo.
E qual deverá ser a nossa posição? Fechar os olhos, como fez a autarquia, especialmente quem tem as competências para intervir na investigação e proteção do património local, como o Dr. Rui Venâncio, e torcer para que os negócios do município não sejam afetados? A atitude da autoridade local quanto a este assunto foi absolutamente desastrosa, como está bem explícito no artigo sobre a escavação, e nada indica que possa mudar face a novos empreendimentos que possam surgir neste terreno.
As estruturas de que este relatório fala estão salvaguardadas por se encontrarem debaixo da Rua Raul Solnado, pelo que a minha preocupação se vira, para além de obviamente para a igreja, também para o terreno à sua direita, que apesar de hoje estar aparentemente vazio foi onde existiu o claustro (do qual resta o poço), e onde deverão ainda estar vestígios significativos da estrutura representada nesta antiga gravura:


Eu creio que o caso do convento é mais grave do que o das muralhas, que estão a sofrer efeitos da erosão natural, porque neste caso há uma intervenção humana consciente: é legítimo provocarmos a destruição de um imóvel com potencial interesse arqueológico, cultural e até artístico sem sequer sabermos o que lá existe?
Eu não defendo que o terreno do convento seja intocável ou se vá fazer um equipamento cultural in situ com base no espólio arqueológico, que noutra terra talvez fosse interessante mas em Peniche não teria adesão. O ideal neste espaço seria a integração dos vestígios encontrados nos novos projetos, como entre muitos outros sítios acontece um pouco por toda a cidade de Braga e em grande escala em Mérida.
A forma como este processo tem sido gerido pela autarquia não é honesta. E eu não posso prometer a ninguém que vá ganhar alguma coisa com o acompanhamento arqueológico das estruturas do convento e a sua possível preservação, mas podemos afirmar com convicção que quando isto se voltar a repetir mais uma vez ninguém saberá o que ficámos a perder.

3 comentários:

  1. O Convento do Bom Jesus, tal como está não serve os interesses de ninguém.
    Não desejava molestar ninguém com este meu parecer.
    Penso que o Convento devia ser recuperado para aproveitamento de um espaço de cultura, tipo casa de chá, onde a decoração seria de natureza sacra, originais ou réplicas de anteriores imagens, e com espólio do levantamento a efetuar no seu átrio.
    Este levantamento seria feito a expensas da Câmara, pelo seu pessoal e acompanhado por arqueólogo acreditado.
    Um espaço assim dignificava a nossa Cidade, sendo ponto de encontro de tertúlias e apreços pela arte e arqueologia.
    Depois do devido levantamento o proprietário escolheria o espólio que entendesse mais adequado para a sua decoração, sendo obrigado a cuidar e a exibir. O remanescente de caris mais religioso seria entregue à paróquia, sendo todo o acervo entregue à CMP para futura exposição no Museu Municipal quando oportuno.
    Todo o seu átrio insere-se numa zona privilegiada em que o terreno terá de ser aproveitado ao milímetro, num projeto rentável, em que Peniche se orgulhe.

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  2. a proposta da compra e recuperação do espaço pelo município é a defendida pelo proprietário do espaço, sr. luiz de almeida, e vai ao encontro daquilo que apresentei no auditório da autarquia em 2009, mas entretanto reformulei o meu discurso porque não me parece absolutamente necessário que o município acarrete com o ónus dos encargos. no entanto acho que um estabelecimento recreativo, como um café ou restaurante, ficava muito bem naquele espaço, aliás, é uma coisa que vejo muito aqui em coimbra, onde os conventos deixaram de fazer sentido e foram adaptados a diferentes fins sem implicar a sua demolição integral.

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